(Dra. Karen Câmara)
As festas de final de ano costumam levar muitas pessoas a beber em excesso, o que resulta naquele mal estar chamado de ressaca no dia seguinte. Os sintomas são conhecidos e desagradáveis: dor de cabeça, tontura, cansaço, náusea, problemas de estômago, mal estar, sudorese, sede, embotamento mental e outros.
A explicação mais simples para tudo isso é o fato que a bebida alcoólica causa desidratação. Esta ocorre por duas razões: o álcool age como diurético, fazendo com que o organismo elimine mais água do que o normal e as pessoas que estão ingerindo bebidas alcoólicas raramente se lembram de tomar água. Podemos acrescentar que, no nosso hemisfério, é verão nessa época do ano, portanto perdemos água também pela transpiração. Portanto, elimina-se mais água e ingere-se menos água. No entanto a desidratação por si só não seria a causa de todos os sintomas.
Sabe-se que o álcool interfere com o metabolismo do corpo humano, faz com que certas atividades celulares sejam menos eficientes, o que diminui as taxas de glicose e causa um desequilíbrio de eletrólitos no sangue.
Mas a teoria mais convincente seria que a ressaca é causada pelo acúmulo de acetaldeído no organismo. O acetaldeído é um produto tóxico resultante do metabolismo do álcool pelo fígado. O fígado tem uma enzima que transforma o álcool em acetaldeído e este é de 10 a 30 vezes mais tóxico que o próprio álcool. O acetaldeído causa sintomas como sudorese, vermelhidão da pele, náusea e vômitos.
O álcool também interfere no sistema imunológico e estudos mostram uma relação entre altos níveis de citocinas e sintomas de ressaca. Citocinas são moléculas usadas pelo sistema imune para mandar sinais entre células e desencadear respostas inflamatórias. A ingesta de grandes quantidades de álcool provoca liberação de citocinas e isso pode causar sintomas como dor muscular, cansaço, dor de cabeça, náusea, irritabilidade e perda de memória.
Por que será que certas pessoas têm ressaca com grande facilidade enquanto outras podem beber sem problemas?
Isso se deve, em parte, à genética. Algumas pessoas e especialmente os asiáticos e seus descendentes apresentam uma mutação genética que faz com que a conversão do álcool em acetaldeído seja muito mais rápida. Uma grande parte dessas pessoas também tem uma mutação na enzima responsável pela próxima etapa metabólica, aquela que converte o acetaldeído em ácido acético. No caso, essa etapa metabólica é mais lenta. Isso provoca um acúmulo rápido e excessivo de acetaldeído no organismo, o que acarreta menor tolerância ao álcool e maiores ressacas.
O peso corporal também influencia, sendo que quanto menor o peso, maior a probabilidade de ter os sintomas da ressaca. Portanto, nesse quesito, as mulheres geralmente estão em desvantagem.
O que realmente causa ressaca é o álcool, portanto quanto maior for a concentração de álcool na bebida, maiores as chances de ter uma ressaca.
Além disso, algumas bebidas alcoólicas possuem maior conteúdo de substâncias químicas secundárias que se formam no processo de fermentação. Esses compostos são chamados de congêneres e, quanto maior a quantidade, maior será a ressaca. Os congêneres contribuem para a cor, o aroma e o gosto da bebida. A vodca, que é incolor e praticamente não tem odor nem gosto, costuma não dar ressaca justamente porque não possui congêneres. Em contrapartida, a ressaca é maior quando se misturam bebidas porque se consome uma variedade maior de congêneres.
Não se deve esquecer que o álcool é um irritante para a mucosa digestiva, podendo causar ou agravar sintomas de gastrite e esofagite.
Existe cura para ressaca?
Não, não existe cura milagrosa. Embora cada povo tenha suas crenças e seus costumes, nenhum alimento ou bebida cura uma ressaca. Alguns acreditam em certas bebidas como café, Coca-Cola, Sprite, chá verde, outros em sopas, peixes, crustáceos e outros pratos para melhorar os sintomas. Também não há nenhuma vantagem em beber mais uma dose de bebida alcoólica no dia seguinte. Isso só vai diminuir temporariamente a percepção dos sintomas da ressaca enquanto o processo de desintoxicação do organismo fica mais retardado.
Analgésicos e antiinflamatórios comuns (não esteróides) podem ajudar a aliviar os sintomas. No entanto, o paracetamol não deve ser usado porque ele também é tóxico para o fígado. Quando o fígado está metabolizando álcool, ele fica mais suscetível aos efeitos tóxicos do paracetamol.
Atualmente há pesquisas que procuram desenvolver uma mistura sintética de substâncias químicas que tenha os mesmos efeitos agradáveis do álcool mas um grau de toxicidade muito menor, de modo a reduzir as chances de uma ressaca. Infelizmente essas pesquisas ainda estão em seus estágios iniciais.
Portanto, se você for beber além da conta, lembre-se que existem formas de minimizar a ressaca: não beber de estômago vazio, não misturar bebidas, beber devagar, beber enquanto faz uma refeição, beber água em intervalos regulares para se manter hidratado.
Uma vez que a ressaca tenha se instalado, pode-se fazer o seguinte para aliviar os sintomas: usar analgésicos (com exceção do paracetamol); fazer uma dieta leve e saudável, beber muita água, repousar, dar tempo para que o fígado metabolize e inative todo o álcool ingerido.